O TEXTO ABJETO E PERFORMATIVO
DO FUTEBOL E DA POESIA
Fernando A. Stratico
Universidade Estadual de Londrina
R E S U M O
Este artigo busca identificar a relação entre a prática do futebol
e a poesia, tomando ambos como produto cultural, porém de
implicações psicanalíticas. Com base no conceito de espaço
semiótico empregado por Julia Kristeva, o artigo aponta para o
texto subjacente das práticas futebolísticas e também literárias,
as quais dependem de estruturas amplas e profundas para sua
existência. Uma das características principais deste texto é o
jogo da abjeção que se articula no contexto da poesia e do
esporte e em outros contextos adjacentes – a violência, o horror
e a disputa revelam um sentido de morte ou aniquilamento,
flagelo e renascimento que se articulam em performances
corporais específicas. Scripts voltados para a construção,
veiculação e incorporação performativa da corporalidade
esportiva são culturalmente elaborados e aprendidos, de modo
a desencadear o texto vivo da masculinidade, do patriotismo,
do heroísmo e do pertencimento. Tanto atletas como público
desempenham corporalmente o grande texto do esporte, que
oferece, sobretudo, a construção e comunicação de identidades.
Há um espaço obscuro que ocupa o interior da poesia e do esporte. O poema, em
seu aspecto performativo, integra-se à escrita do futebol e nela encontra correspondência,
pois em ambos há uma narrativa e trajetória de aniquilamento, dissolução e vitória, que
são descritas e revividas com o corpo em cada evento. Como argumentaremos, contrapõese
a esse espaço terrível a noção de jogo e poesia inocentes, que procura construir uma
imagem de pureza para as articulações poéticas e esportivas. Tentaremos demonstrar
como tais imagens não conseguem esconder a experiência fronteiriça do risco e da
abjeção que marcam tanto a escrita poética como a futebolística.
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